Nos
dia 13 e 14 contaremos com a presença da Professora Doutora Raquel Dias, da
Unicidade Estadual do Ceará (UECE). Raquel atuou por muito tempo na direção do
ANDES, onde pode travar um debate muito intenso a respeito da precarização das
Universidades Estaduais no Brasil. Durante o seminário sobre Carreira e
Encargos Docentes, organizado pela a ADCESP, a professora poderá compartilhar
conosco um pouco desse debate tão importante para a educação pública e também
para nossa universidade.
Antes
do seminário, entrevistamos a professora Raquel Dias e abordamos diferentes
assuntos, desde o cenário atual das universidades estaduais até a luta nacional
pelo Plano de Cargos Carreira e Salário. Confira a entrevista na integra.
ENTREVISTA COMPLETA:
ADCESP:
VAMOS COMEÇAR FALANDO DO CENÁRIO ATUAL
DAS UNIVERSIDADES ESTADUAIS ESPALHADAS PELOS PAÍS. DIFERENTE DAS INSTITUIÇÕES
FEDERAIS, CADA UNIVERSIDADE ESTADUAL TEM SUAS ESPECIFICIDADES, TANTO NO QUE DIZ
RESPEITO AOS INVESTIMENTOS, FORMA DE FINANCIAMENTO E ESTRUTURA. ENTRETANTO, É
POSSÍVEL FAZER UMA ANÁLISE MAIS GERAL DO CENÁRIO DESSAS INSTITUIÇÕES? QUAIS OS
PROBLEMAS QUE MAIS APROXIMAM AS UNIVERSIDADES ESTUDAM HOJE?
Raquel Dias: As Universidades Estaduais têm suas especificidades quanto ao financiamento, à estrutura, à autonomia e democracia etc., mas há problemas comuns. Sem dúvida, um dos problemas centrais é a precarização das Universidades e do trabalho docente, que se revela nas condições infraestruturais, nas condições de trabalho e salariais da maioria. Muitas Universidades Estaduais têm enfrentado processos de luta e greve, nos últimos anos, com a pauta da precarização. A precarização tem uma relação muito direta com o problema do financiamento, que tem a ver com a ausência de vinculações orçamentárias específicas, em alguns casos, ou o seu descumprimento, em outros, ou ainda, com a insuficiência dos recursos destinados às Universidades Estaduais.
ADCESP:
ALGUMAS QUESTÕES, COM TRIPÉ
UNIVERSITÁRIO (ENSINO-PESQUISA-EXTENSÃO), ESTÃO PRESENTES EM TODAS AS
INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR. NESSE PONTO ESPECIFICO, QUAL SUA ANALISE A
RESPEITO DA PRÁTICA DO ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO NAS UNIVERSIDADES ESTADUAIS
DO BRASIL?
Raquel
Dias:
A indissociabilidade entre ensino-pesquisa-extensao é um tripé garantido na
Constituição e defendido pelo ANDES-SN, mas que, na prática, não é cumprido na
maioria das instituições de ensino superior. Há os chamados centros de
excelência, que realizam pesquisas, e o restante das universidades que assumem
muito mais o papel do ensino em detrimento da pesquisa e da extensão. Há um
apelo pelo produtivismo, por um lado, mas, por outro, não há uma contrapartida
consequente quanto à oferta de condições de pesquisa que garanta a produção do
conhecimento científico com mais qualidade. A extensão, por sua vez, tem um
lugar muito desprestigiado nesse tripé.
ADCESP:
A UESPI HÁ MUITOS ANOS SOFRE COM UMA
SÉRIE DE PROBLEMAS, TODAVIA, O QUE MAIS CHAMA ATENÇÃO E TAMBÉM MAIS AFETA O
CONJUNTO DA COMUNIDADE ACADÊMICA É A AUSÊNCIA DE UMA AUTONOMIA FINANCEIRA PARA
GESTÃO DOS RECURSOS DESTINADOS A UNIVERSIDADE. TODA A VERBA QUE VAI PARA A
UESPI CAI NA CONTA ÚNICA DO ESTADO E PARTE DELA NÃO CHEGA A SER SEQUER UTILIZADA,
MESMO COM INÚMERAS CARÊNCIAS. NO QUE DIZ RESPEITO Á AUTONOMIA FINANCEIRA,
PODEMOS DIZER QUE É UM PROBLEMA NACIONAL ENFRENTADO PELAS UNIVERSIDADES
ESTADUAIS?
Raquel
Dias:
A ausência da autonomia financeira é um nó górdio. Este também é o caso
das Universidades Estaduais do Ceará. Parece-me que é uma característica da
maioria das IEES. O tipo de autonomia que o Estado quer garantir às
Universidades Estaduais diz respeito à sua capacidade de captação de recursos
oriundos de outras fontes para além daqueles provenientes do orçamento público.
O que o movimento docente defende historicamente é a autonomia quanto à gestão
(o que implica à definição de prioridades) do recurso proveniente
exclusivamente de fonte publica. Está ausência de autonomia quanto à gestão do
recurso, bem como à definição de prioridades no âmbito das próprias IEES
impede, muitas vezes, a resolução de problemas simples relacionados à estrutura
da universidade, à realização de concursos para pessoal técnico-administrativo
e docente, dentre outros.
ADCESP:
E NO QUE DIZ RESPEITO ÀS QUESTÕES
ESTRUTURAIS, QUAL O CENÁRIO DAS UNIVERSIDADES ESTADUAIS? AS QUESTÕES
ESTRUTURAIS, CLARO, AFETAM QUALIDADE DA EDUCAÇÃO, O DESEMPENHO DOS ESTUDANTES E
A PRÁTICA PEDAGÓGICA DOS DOCENTES. E AS CONDIÇÕES DE TRABALHO SEMPRE ESTIVERAM
NA PAUTA DE REIVINDICAÇÃO DA CATEGORIA. COMO VOCÊ AVALIA ESSE CENÁRIO, LEVANDO
AINDA EM CONSIDERAÇÃO, O PERÍODO CONTURBADO EM QUE ESTAMOS DE CRISE POLÍTICA E
ECONÔMICA?
Raquel
Dias:
Como disse anteriormente, um dos problemas centrais das Universidades Estaduais
tem sido a precarização que se expressa também na estrutura da universidade.
Para que as universidades funcionem a contento são necessárias determinadas
condições estruturais, como, por exemplo, existência de salas de aula em boas
condições quanto ao espaço, à ventilação, à iluminação; existência de
laboratórios de ensino, de informática, de ciências etc. auxiliares às
atividades de ensino e necessários às atividades de pesquisa; a implementação
de políticas de assistência estudantil como garantia de permanência do
estudante na universidade, o que implica a existência de restaurantes
universitários e residências universitários; a existência de bibliotecas,
quadras poliesportivas etc.
O problema é que essas condições
mínimas, em muitas universidades, sequer estão garantidas. As últimas greves
das Universidades Estaduais do Ceará tinham uma pauta extensa quanto à melhoria
da estrutura da universidade.
Esse problema também afeta as universidades Federais e foi pauta desta última greve.
No momento atual de crise econômica e política, marcado principalmente pelo corte no orçamento e na retirada de direitos da classe trabalhadora, a situação se complica muito, pois a tendência é que os governos estaduais e municipais sigam a orientação do governo federal de aplicação do plano de ajuste fiscal com medidas que atingem diretamente as políticas sociais e, em particular, a educação em todos os níveis.
Esse problema também afeta as universidades Federais e foi pauta desta última greve.
No momento atual de crise econômica e política, marcado principalmente pelo corte no orçamento e na retirada de direitos da classe trabalhadora, a situação se complica muito, pois a tendência é que os governos estaduais e municipais sigam a orientação do governo federal de aplicação do plano de ajuste fiscal com medidas que atingem diretamente as políticas sociais e, em particular, a educação em todos os níveis.
Os governos do estado do Ceará, Camilo
Santana (PT), já anunciou o congelamento de salários, por exemplo. O
governo do estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, decretou o fechamento de
várias escolas. O governo Dilma efetuou vários cortes no orçamento da educação,
cancelou concursos e adiou o ínfimo reajuste dos servidores federais para
agosto de 2016. Tudo isto tem impacto imediato no funcionamento das
universidades, como ocorreu com as IFES, com o corte das verbas de custeio e
atinge sobremaneira as condições de trabalho e a qualidade do ensino.
ADCESP: AGORA
COM RELAÇÃO AOS PLANOS DE CARREIRA. PRIMEIRO QUERIA QUE VOCÊ EXPLICASSE O QUE É
UM PLANO DE CARGO CARREIRA E SALÁRIO!?
Raquel
Dias:
O Plano de Cargos, Carreira e Salários /Vencimentos é o documento que define os
termos da carreira docente, definindo as atividades específicas de ensino,
pesquisa, extensão as quais estão submetidos os ocupantes do cargo / função de
professor de determinada instituição, bem como delimita as condições sob as
quais estas atividades serão realizadas, inclusive as salariais. O Plano
estabelece, portanto, as condições para o desenvolvimento da carreira ao longo
da trajetória do docente na universidade (progressão, ascensão, formação,
salário etc.). A existência do Plano é fundamental para a valorização da
carreira docente e garantia de melhores condições de trabalho e salariais.
ADCESP:
DEPOIS, QUERIA QUE VOCÊ FALASSE COMO
ESTÁ, ATUALMENTE, O PCCS DOS DOCENTES E COMO O ANDES REIVINDICA QUE ELE SEJA!?
Raquel
Dias:
Não conheço a situação de cada IEES, mas posso dizer que, no caso das
Universidades Estaduais do Ceará, a luta travada durante anos, mas que teve seu
ápice entre os anos de 2005 e 2008, por meio de três greves, garantiu a
aprovação do nosso PCCV. Nós consideramos uma grande vitória pois instituiu a
melhoria significativa na remuneração dos professores e a recuperação das
perdas salariais acumuladas em 12 anos; fortaleceu o vencimento-base; instituiu
a gratificação de dedicação exclusiva e de trabalho em condições especiais
(esta ainda não regulamentada), dentre outras conquistas.
O ANDES-SN defende uma carreira única
para o magistério superior, a paridade entre ativos e aposentados, critérios de
avaliação respeitando a autonomia universitária, como referencia para a
construção de um projeto de Universidade Pública, Gratuita, de Qualidade e
Socialmente referenciada aos interesses da maioria da população do país.
ADCESP:
PARA FINALIZAR, QUERIA QUE VOCÊ FIZESSE
UM CHAMADO A TODOS OS DOCENTES A SE INCORPORAREM NA LUTA EM DEFESA DA
VALORIZAÇÃO DOCENTE E EM DEFESA DA EDUCAÇÃO!
Raquel
Dias:
Para finalizar, gostaria de fazer um convite à luta a todos os professores e
todas professoras para se engajarem efetivamente na defesa da educação
pública e gratuita e da valorização do trabalho docente. Nesse momento complexo
da conjuntura econômica e política do país, caracterizada por ataques profundos
aos nossos direitos, a nossa luta por questões imediatas e
específicas se não assumir um caráter de luta global contra todo o pacote
de ajuste fiscal do governo, corre o risco de se tornar inócua. Acredito que o
caminho da unidade da classe trabalhadora e da unificação das lutas, nesse
contexto, seja condição para a garantia de qualquer reivindicação mínima.
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